Mostrar mensagens com a etiqueta Poesia. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Poesia. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, abril 01, 2008

Ruy Belo

Passados trinta anos sobre a morte de Ruy Belo, a Assírio & Alvim organizou para hoje, dia 1, uma sessão evocativa da vida e obra do poeta. Esta sessão terá lugar na Fnac do Chiado, pelas 18h30, e contará com a presença de José Tolentino Mendonça e Duarte Belo.


sexta-feira, março 21, 2008

Dia da Poesia

Para além dos eventos que se multiplicam um pouco por todo o país, não haverá certamente melhor forma de comemorar o Dia da Poesia do que ler poesia e, porque não, ouvi-la também. Deixo aqui o Black Rook on Rainy Weather, da Sylvia Plath, com o link para poderem ouvir a própria Sylvia Plath a declamar este poema.

Black Rook in Rainy Weather

On the stiff twig up there
Hunches a wet black rook
Arranging and rearranging its feathers in the rain.
I do not expect a miracle
Or an accident

To set the sight on fire
In my eye, nor seek
Any more in the desultory weather some design,
But let spotted leaves fall as they fall,
Without ceremony, or portent.

Although, I admit, I desire,
Occasionally, some backtalk
From the mute sky, I can't honestly complain:
A certain minor light may still
Lean incandescent

Out of kitchen table or chair
As if a celestial burning took
Possession of the most obtuse objects now and then –
Thus hallowing an interval
Otherwise inconsequent

By bestowing largesse, honor,
One might say love. At any rate, I now walk
Wary (for it could happen
Even in this dull, ruinous landscape); skeptical,
Yet politic; ignorant

Of whatever angel may choose to flare
Suddenly at my elbow. I only know that a rook
Ordering its black feathers can so shine
As to seize my senses, haul
My eyelids up, and grant

A brief respite from fear
Of total neutrality. With luck,
Trekking stubborn through this season
Of fatigue, I shall
Patch together a content

Of sorts. Miracles occur,
If you care to call those spasmodic
Tricks of radiance miracles. The wait's begun again,
The long wait for the angel,
For that rare, random descent.

Sylvia Plath


--------------------------

A Gralha Negra em Tempo de Chuva

Lá no alto, num ramo firme
arqueia-se uma gralha negra toda molhada
arranjando e voltando a arranjar as penas à chuva.
Não espero qualquer milagre
nem nada

que venha lançar fogo à paisagem
no interior dos meus olhos, nem procuro
mais no tempo inconstante qualquer desígnio,
mas deixo as folhas manchadas cair conforme caem,
sem cerimónia ou maravilha.

Embora – admito-o – deseje
ocasionalmente alguma resposta
do céu mudo, não posso honestamente queixar-me:
uma certa luz pode ainda
surgir incandescente

da mesa da cozinha ou da cadeira
como se um fogo celestial tornasse
seu, de um instante para outro, os mais estranhos objectos,
assim consagrando um intervalo
de outro modo inconsequente

para nos dar grandeza e glória,
ou até amor. De qualquer modo, caminho agora
atenta (pois isso poderia acontecer
mesmo nesta paisagem triste e arruinada); descrente,
mas astuta, ignorante

de que um anjo se decida a resplandecer
repentinamente a meu lado. Apenas sei que uma gralha
ordenando as suas penas negras pode brilhar
de tal maneira que prenda a minha atenção, erga
as minhas pálpebras, e conceda

um breve repouso com medo
de uma neutralidade total. Com sorte,
viajando teimosamente por esta estação
de fadiga, acabarei
por juntar um conjunto

de coisas. Os milagres acontecem
se gostares de invocar aqueles espasmódicos
gestos de luminosos milagres. A espera recomeçou de novo,
A longa espera pelo anjo,
por essa rara, fortuita visita.

Poema retirado de Pela Água, Sylvia Plath (edição bilingue), tradução de Maria de Lourdes Guimarães, Assírio & Alvim.

sábado, abril 21, 2007

Anna Enquist


Disse, há uns tempos, que a poesia passaria a estar mais presente no Olho da Letra. A partir de agora deixarei aqui os poemas e os poetas que vou descobrindo (ou redescobrindo).

Hoje, é um poema da holandesa Anna Enquist que aqui fica. Anna Enquist (1945), pseudónimo escolhido por Christa Widlund-Boer, viu o seu primeiro livro de poemas, Soldatenliederen (título que poderá ser traduzido em português como “canções de soldados”), publicado em 1991. Embora a maior parte da sua obra seja dedicada à poesia, é também autora de romances. Alguns dos seus livros já foram traduzidos entre nós (O Segredo e A Obra-prima), mas ainda não conheço a Anna Enquist romancista.

Descobri o poema “Mentiras em tempo de Groselhas” numa antologia de poesia neerlandesa, editada pela Assírio & Alvim. Uma Migalha na Saia do Universo reúne poemas belgas e holandeses do século XX, numa selecção de Gerrit Komrij. Se tiverem oportunidade, vale a pena lerem este livro, a começar pela introdução de Gerrit Komrij. Uma vez que esta é uma edição bilingue, aqui fica o poema de Anna Enquist em neerlandês e em português.

Leugens in Bessentijd

Welke constructie is steviger, heeft langer
standgehouden. En hoe meer er wonen, hoe
minder je wegkomt. Waarheen. Het verlangen
is een zomerhuis zonder kookplaats en zonder
geschiedenis. Hier ben ik omdat ik hier ben.


Vannacht was ik wakker, het waaide, regen
striemde de kastanje terwijl het al licht werd,
de nacht had geen rust gebracht. Ik wist
wel hoe dat zat, ging slapen en ontwaakte
in een stille morgen, wit van verdriet.

Men kan niet blijven zeuren. De pruimen
ploffen rottend van de bomen, in de koude
tuin worden de kleuren snel ouder.
Alles er-
varen zonder verdoving, pannen klaarzetten en
suiker, archieven beheren, scherven bewaren.

Mentiras em tempo de groselha

Que construção é mais sólida, se aguentou
mais tempo. E quantos mais aí moram, menos se
a consegue abandonar. Para onde. Anseia-se
por uma casa de Verão sem um fogão e sem
história. Estou aqui porque estou aqui.


Esta noite estive acordada, fazia vento, chuvas
fustigavam o castanheiro, enquanto já vinha o dia,

a noite não tinha trazido paz. Eu sabia

como eram as coisas, fui dormir e acordei

numa manhã de silêncio, lívida de tristezas.


Não se pode continuar com lamúrias. As ameixas
baqueiam podres das árvores, no frio
quintal as cores envelhecem velozes. Experi-
mentar tudo sem anestesia, pôr a postos as panelas e
o açúcar, gerir os arquivos, guardar os cacos.


Uma Migalha na Saia do Universo, selecção e introdução de Gerrit Komrij, tradução de Fernando Venâncio, Assírio & Alvim, Lisboa, 1997.

quarta-feira, março 21, 2007

Poesia

Nunca aqui falei de poesia, nunca destaquei nenhum livro de poesia e, pensando bem, são poucos os livros de poesia que aparecem nas minhas leituras em progresso, muito embora agora esteja a ler Walt Whitman. A conclusão mais rápida a tirar será a de que não gosto de poesia. A verdade, no entanto, é que a conclusão acertada a retirar desta ausência será a conclusão mais rebuscada: gosto muito de poesia, leio muita poesia e, por isso, nunca falo dela. A verdade não é tão paradoxal como possa parecer. Não há muitas leituras de volumes de poesia destacadas porque eu não gosto de ler livros de poesia de forma sistemática, ou seja, eu salto de poema em poema e nem sempre dentro do mesmo livro. Um poema, ou um verso, podem fazer-me lembrar outro poema que li e lá vou eu remexer nas minhas estantes. Não consigo ler livros de poesia do princípio ao fim como leio um romance, por exemplo. Cada poema ocupa, na minha cabeça, o mesmo espaço que um conto, um romance… É uma unidade completa, que precisa de tempo para ser pensada e para ser guardada. Só assim posso construir as minhas bibliotecas: a física e a que fica arquivada dentro da minha cabeça. O Canto de Mim Mesmo não há-de ser lido ininterruptamente da primeira à última página.; talvez desapareça e volte a aparecer daqui a uns dias. Porque é que nunca escrevi sobre um poema, um livro, um poeta como já o fiz em relação a outros géneros literários? Isso é uma pergunta mais difícil de responder. Não sei ao certo… Nem sou obrigada a saber. Não é que seja incapaz de analisar poesia, já o fiz muitas vezes (sempre com hora marcada, é certo), simplesmente agora não o quero fazer por escrito, apenas mentalmente. Só devemos fazer as coisas porque queremos. Leio o que quero, quando quero; escrevo o que quiser, quando achar que o posso fazer como quero.
Porém, decidi suprimir a minha falta por algo mais útil e mais interessante. Hoje, assinala-se o dia mundial da poesia no Olho da Letra com um poema de António Maria Lisboa. A partir de hoje, a poesia estará mais presente no blogue e de forma regular.













CONJUGAÇÃO

A construção dos poemas é uma vela aberta ao meio e coberta de bolor
é a suspensão momentânea dum arrepio num dente fino
Como Uma Agulha

A construção dos poemas
A CONS
TRU
ÇÃO DOS
POEMAS

é como matar muitas pulgas com unhas de oiro azul
é como amar formigas brancas obsessivamente junto ao peito
olhar uma paisagem em frente e ver um abismo
ver o abismo e sentir uma pedrada nas costas
sentir a pedrada e imaginar-se sem pensar de repente

NUM TÚMULO EXAUSTIVO.




António Maria Lisboa, Poesia de António Maria Lisboa, Assírio & Alvim, Lisboa, 1995.