quarta-feira, março 21, 2007

Poesia

Nunca aqui falei de poesia, nunca destaquei nenhum livro de poesia e, pensando bem, são poucos os livros de poesia que aparecem nas minhas leituras em progresso, muito embora agora esteja a ler Walt Whitman. A conclusão mais rápida a tirar será a de que não gosto de poesia. A verdade, no entanto, é que a conclusão acertada a retirar desta ausência será a conclusão mais rebuscada: gosto muito de poesia, leio muita poesia e, por isso, nunca falo dela. A verdade não é tão paradoxal como possa parecer. Não há muitas leituras de volumes de poesia destacadas porque eu não gosto de ler livros de poesia de forma sistemática, ou seja, eu salto de poema em poema e nem sempre dentro do mesmo livro. Um poema, ou um verso, podem fazer-me lembrar outro poema que li e lá vou eu remexer nas minhas estantes. Não consigo ler livros de poesia do princípio ao fim como leio um romance, por exemplo. Cada poema ocupa, na minha cabeça, o mesmo espaço que um conto, um romance… É uma unidade completa, que precisa de tempo para ser pensada e para ser guardada. Só assim posso construir as minhas bibliotecas: a física e a que fica arquivada dentro da minha cabeça. O Canto de Mim Mesmo não há-de ser lido ininterruptamente da primeira à última página.; talvez desapareça e volte a aparecer daqui a uns dias. Porque é que nunca escrevi sobre um poema, um livro, um poeta como já o fiz em relação a outros géneros literários? Isso é uma pergunta mais difícil de responder. Não sei ao certo… Nem sou obrigada a saber. Não é que seja incapaz de analisar poesia, já o fiz muitas vezes (sempre com hora marcada, é certo), simplesmente agora não o quero fazer por escrito, apenas mentalmente. Só devemos fazer as coisas porque queremos. Leio o que quero, quando quero; escrevo o que quiser, quando achar que o posso fazer como quero.
Porém, decidi suprimir a minha falta por algo mais útil e mais interessante. Hoje, assinala-se o dia mundial da poesia no Olho da Letra com um poema de António Maria Lisboa. A partir de hoje, a poesia estará mais presente no blogue e de forma regular.













CONJUGAÇÃO

A construção dos poemas é uma vela aberta ao meio e coberta de bolor
é a suspensão momentânea dum arrepio num dente fino
Como Uma Agulha

A construção dos poemas
A CONS
TRU
ÇÃO DOS
POEMAS

é como matar muitas pulgas com unhas de oiro azul
é como amar formigas brancas obsessivamente junto ao peito
olhar uma paisagem em frente e ver um abismo
ver o abismo e sentir uma pedrada nas costas
sentir a pedrada e imaginar-se sem pensar de repente

NUM TÚMULO EXAUSTIVO.




António Maria Lisboa, Poesia de António Maria Lisboa, Assírio & Alvim, Lisboa, 1995.

1 comentário:

Anónimo disse...

PERFEITA!